sexta-feira, 3 de julho de 2009
- Sente-se. – Ele disse calmamente enquanto me ajudava a chegar ao sofá.
Eu realmente não sabia se concentrava meus esforços em tentar respirar ou em tentar não vomitar. De repente, parecia que tudo o que eu havia comido naquele dia estava retornando.
Meu pai estava morto há mais de seis anos. Seis longos anos. Seis torturantes anos. Deveria ser uma brincadeira de muito mau gosto, no mínimo, um imbecil querendo passar algum trote. Era nisso que eu queria acreditar.
Não fazia sentido que, do nada, ele me deixara uma encomenda. O que ele haveria de querer que eu recebesse quando fizesse dezoito anos? E por que ele supôs que não estaria vivo para, ele mesmo, me entregar esse pacote, seja lá o que for? Quero dizer, quem é que prevê a própria morte? Eu não queria pensar nisso.
Tentei concentrar-me em outra coisa, qualquer outra coisa. Não adiantou, minha cabeça ainda estava dando voltas e meu estômago revirava quase no mesmo compasso.
Deitei-me com cautela no sofá da sala e percebi os movimentos rápidos do Sam para buscar um copo d’água ou retirar a minha franja da frente do meu rosto. Pude sentir seu olhar preocupado me analisando, como se fizesse um raio-x para tentar descobrir o que havia de errado comigo.
E o que havia de errado comigo?
Eu certamente poderia responder. Meu pai morto me deixara uma encomenda. Como se já não fora doloroso o bastante seguir em frente e tentar esquecer a perda, agora alguém fizera questão de revirar um passado que eu havia lutado para enterrar. Isso era o que havia de errado comigo.
- Está tudo bem. – Ele tentou sorrir e acariciou meus cabelos. Acho que ele tinha entendido o que eu estava sentindo.
Minha visão finalmente começou a entrar em foco e consegui ver Sofie lendo a carta cuidadosamente, como se a estivesse digerindo e lutando para não deixar escapar nem um pedaço sequer. Ela estava muito concentrada e apoiava os dedos da mão direita sobre o queixo, prova número um de que estava raciocinando.
- Você acha que ele também me deixou algo? – Ela perguntou muito assustada, estava mais branca do que o normal.
- Ótimo. Vamos esperar cinco anos para descobrir. – Eu resmunguei em meio ao nervosismo. Agora que estava conseguindo enxergar melhor, percebi que as minhas mãos estavam tremendo.
- Vamos mudar de assunto. Sofia, guarde isto. – Sam ordenou e ela obedeceu, enfiando a carta dentro de uma das gavetas da estante da sala. Em seguida, jogou-se na cadeira na qual estivera sentada minutos antes. – Ainda está tonta? – Ele, que estava ajoelhado ao lado do sofá, aproximou-se ainda mais de mim.
- Eu estou bem.
- Não, não está. – Ele me lançou o olhar de preocupação que me deixava aborrecida. Esse olhar diminuía o verde claro dos olhos, tornando-os mais melancólicos e escuros. – Mas vai ficar.
- Podemos parar de bancar o Barney e seus Amigos e nos ater a real situação? – Sofia perguntou impacientemente.
- O quê? Você acha que estou contente? – Eu sorri ao pensar nessa ironia. Certamente, minha irmã estava pensando que eu estava feliz com isso, que não era nada difícil enfrentar o passado batendo novamente à sua porta, literalmente.
- Não foi o que eu disse. Só estou dizendo que esse seu ataque de nostalgia não está ajudando em nada.
- Sofia... – Sam alertou-a de que estava passando dos limites.
- Eu não estou brincando. Não é motivo para ficar desse jeito. Provavelmente é só alguma coisa que ele guardou para ela.
- E por que ele quis que eu o recebesse só agora?
- Não sei. Como você espera que eu leia os pensamentos de alguém que mal conheci? – Ela se irritou e saiu marchando. O barulho dos seus passos só parou quando foram interrompidos pela batida da porta do quarto.
- Ela acha que estou exagerando. – Eu constatei com amargura.
Eu sabia o porquê de Sofia pensar nisso, ela não sabia a história completa. Se o que estava escrito naquela carta fosse verdade, era, provavelmente, o motivo de estarem me perseguindo. Era isso o que eles queriam... Mas o que poderia ser?
- Ela não sabe o que diz. – Ele sorriu e beijou minha testa. – Acalme-se. Nada vai acontecer a você.
- Eu só... Não entendo.
- Diga-me o que você não entende. – Sam falou enquanto beijava meus cabelos com cautela. Senti sua respiração muito perto.
- Por que eu? O que eu posso receber de tão importante? Se é isso o que querem, podem ficar. Eu não faço questão alguma.
- Você não sabe o que é. – Ele tinha razão nessa.
- Não acho que seja algo que valha mais do que a segurança da minha família. Se entregar essa encomenda assegurar que eu me livrarei desses problemas, serei a primeira a dá-la a eles.
- Você não pode fazer isso... – Ele levantou meu tronco com leveza e sentou-se no sofá. Apoiei minha cabeça em seu colo enquanto ele continuava a acariciar os cabelos.
- Claro que eu posso. Eu não quero essa herança.
- Se o seu pai quis que fosse entregue somente para você aos 18 anos, significa que ele acreditou que você teria responsabilidade o suficiente para guardá-la com sabedoria. Pense nisso.
Eu olhei para cima e encarei seu rosto dolorosamente bonito. Era incrível como eu odiava quando ele estava certo. Apesar desse pacote que o meu pai me deixou ser, na maior probabilidade, o objeto que está nos colocando em perigo, era algo que ele me deixara por alguma razão. Eu não poderia simplesmente entregar para essas pessoas capazes até de vasculhar a minha casa inteira em sua procura. Quero dizer, como poderia entregar o ouro ao bandido? Por outro lado, como poderia colocar a segurança da minha família em risco? Certo, talvez eu estivesse arrependida de reclamar tanto da minha vida outrora pacata.
Eu fiquei imersa nesses pensamentos por muitos minutos, Sam não reclamou. Ele só continuou a brincar com meus cabelos enquanto eu me postava com a cabeça apoiada em seu colo.
Levou algum tempo para que eu pudesse organizar meus pensamentos e pensar nos meus próximos passos. Eu não contaria nada a ninguém, pediria a Sofie para manter o segredo. Eu decidi, finalmente, por esperar e ver o que acontece. Não há como eu decidir o que fazer antes que eu saiba o que é essa ”coisa”. Quero dizer, um covarde morre diversas vezes antes de, realmente, morrer. Ficar agonizando antes de ter certeza da real situação e ficar sofrendo por meras hipóteses só iria me fazer sofrer infinitas vezes antes de, se for o caso, ter que fazer uma escolha.
- Está tarde.
- Fique mais um pouco.
- Você sabe que não posso.
Ele disse com muita cautela, mas eu percebi a tristeza que sentiu por não poder ficar e me dar mais apoio. Eu havia esquecido completamente da hora e me senti culpada por ter feito o pedido sabendo que o entristecia profundamente não poder acatá-lo.
- Tudo bem. – Eu tentei sorrir, mas as veias na minha testa ainda estavam latejando. Iria ser uma péssima noite.
- Não precisa fingir que está tudo bem. – Ele falou antes de se levantar e caminhar em direção à porta.
- Eu já fiz a escolha, Sam. E escolhi você.
- Só estou dizendo que este é um exemplo típico do que eu havia dito noite passada. Há limites.
- Se eu me importasse, não estaria dizendo até amanhã. – Aproximei-me e beijei-lhe os lábios quentes. Era isso o que me dava forças para continuar.- Até amanhã.
Ele sorriu.
Não tive uma boa noite de sono, na verdade, mal consegui dormir. Embora tenha decidido esperar para saber o que me fora deixado em circunstâncias tão irreais, era difícil me concentrar em outra coisa.
Minha noite intercalava momentos de pesadelos e momentos de insônia. Um pouco cruel, mas nada que pudesse me fazer desistir. Eu havia ganhado um novo vigor, uma espécie de nova energia que me impulsionava a continuar. Uma voz no fundo de minha consciência dizendo-me que, no final, tudo daria certo.
De uma hora para outra, alguns buracos me furavam o ser. Esse perigo iminente, essa volta inusitada de algo que já deveria ter ficado para trás produziu esse efeito em mim. O mais estranho era que, ao mesmo tempo, eu era capaz de sentir que eu tinha alguém em quem confiar. Um porto seguro. Não era que eu precisasse de defesa, mas não creio que conseguiria suportar tudo se estivesse sozinha, se não sentisse o calor de seus olhos verdes perfurando a minha pele e tocando minha alma.
Para melhorar um pouco a situação, as coisas no colégio estavam ficando menos tensas. Muitos dos alunos haviam parado de me encarar, embora uma vez ou outra eu recebesse pedidos para autografar alguns cadernos cor-de-rosa de algumas meninas da sexta série. Eu gostava disso. Não porque elas, por algum motivo, me admiravam, mas porque eu havia descoberto que eram boas pessoas, então eu sempre fazia questão de dizer algumas frases de incentivo para que continuassem assim no futuro. Chega de Petrys no mundo.
Alguns dias se passaram com extrema rapidez. Eu havia descoberto que o tempo parece voar quando você se perde em pensamentos, principalmente em aulas monótonas. É claro que eu tentava me focar em outras reflexões, mas, ora ou outra, não conseguia evitar perguntar a mim mesma o que meu pai poderia ter guardado para mim e feito questão de que eu, e somente eu, recebesse aos 18 anos.
Sam percebia muitas vezes a minha distração, principalmente nos momentos em que jogávamos palavras cruzadas de tabuleiro.
- “Pacote, entrega, final, tempo, pai, vida”. Tem certeza de que não quer conversar sobre isso?
- Sobre o quê?
Eu sabia que minhas tentativas de fingir que não sabia do que ele estava falando eram fracassadas, mas eu também tinha certeza de que ele não insistiria.
Estávamos aprendendo um com o outro. Eu havia crescido em múltiplos aspectos, como por exemplo, tinha aprendido a ceder. Claro que gostávamos de discutir às vezes para ver quem escolheria o restaurante – sim, de vez em quando cansávamos dos enlatados – quem compraria o sorvete, ou quem alugaria o filme, mas o importante é que descobrimos que não havia porque alguém ganhar sempre. Então intercalávamos os desejos, já que éramos dois cabeças-duras.
Eu tinha autoridade, ele também tinha. Ele me protegia, eu também fazia isso. Nosso relacionamento não era complementar, era suplementar. Porque juntos, não completávamos um ao outro como duas peças de quebra-cabeças, mas crescíamos e nos tornávamos mais fortes. Eu desconfiava seriamente de que esse era o principal motivo pelo qual meu sentimento não diminuía, mas pelo contrário. E, para falar a verdade, isso me deixava angustiada.
Quando eu revejo os meus sentimentos de nervosismo perante esse fato inegável – o de que o que eu sentia só vinha crescendo – penso no que Rebecca provavelmente diria: “você enlouqueceu? Por que ter alguém perfeito para você te deixa angustiada?”, mas eu tenho uma boa explicação para esse fato incomum.
Eu sei que, hoje em dia, falar “eu te amo” tornou-se algo mais que comum, o tipo de coisa que qualquer pessoa fala para outra diante de qualquer situação. O tipo de frase que todos acham bonita demais para enfeitar depoimentos de páginas de relacionamentos na internet, ou que, simplesmente, têm uma pronúncia bacana que todos gostam de ouvir.
É certo que todos gostam de saber que são amados, mas o meu problema é que eu me recuso a dizer tais palavras se não tiver certeza do pleno significado que elas têm. Amor, ao contrário do senso comum, não é gostar muito de alguém. Dizer “eu te amo” acarreta muito mais responsabilidade do que muitos podem pensar. É estar lá quando o outro precisa, é colocar-se no lugar dele, é respeitar, ajudar, guiar, saber ouvir e, acima de tudo, pensar no outro antes de em você mesmo. É por esse motivo que eu preferia minha morte à de Sofia. É pelos mesmos motivos que tenho certeza de que amo meus dois melhores amigos. Resumindo, é algo muito profundo e intenso para ser dito levianamente.
Eu nunca havia falado estas palavras para alguém antes, não no sentido amoroso. Como tudo em minha vida fora muito passageiro nesse sentido, era um assunto muito delicado com o qual eu, admito, não sabia realmente como lidar. Foi daí que surgiu o nervosismo.
Começou tímido, com as pernas trêmulas e o arrepio na espinha. Cada dia que s
e passava, tornava-se mais intenso e inevitável. Era difícil escondê-lo ou fugir dele. Estava incrustado em mim.
- Estive com você hoje à tarde. – Falei eventualmente, colocando a letra “R” para formar a palavra “Segredo”.
- Eu tive uma pequena impressão de que isso havia acontecido. Como você não comentou nada até agora, pensei que havia imaginado.
- Não imaginou, estivemos sim juntos.
- O que eu fiz? Te encontrei no elevador? – Ele perguntou distraído enquanto analisava as letras que ele ainda tinha na caixa para pensar em alguma palavra.
- Não. – Eu olhei para cima. – Me levou para tomar sorvete.
Ele parou de observar as letras na mesma hora e me encarou com seriedade.
- Nunca achei que teria ciúmes de mim mesmo. – Sorriu com o humor negro.
Eu era capaz de compreender este sentimento. Não era preciso que ele o verbalizasse para que eu soubesse o quanto Sam sofria por não poder estar por perto o tempo todo. O quanto se sentia um lixo por ser um namorado pela metade. E, pior, se sentia um monstro por não conseguir se livrar do sentimento de vingança que o assolava.
Era um pouco obscuro pensar nesse assunto. Havia muitas coisas que me assustavam. Eu, definitivamente, não era a favor da violência e, tudo o que eu queria, era que ele parasse com o rancor e ocupasse esse espaço pelo que sentia por mim. Não se pode ter tudo.
Parece, na verdade, irônico dizer que ele tinha uma face totalmente inversa. Porque, ao lembrar-me dos momentos que passamos juntos hoje na sorveteria, eu percebia que não havia ódio, não havia vingança, não havia terror, urgência, trevas ou perigo estampados nos olhos cor de oliva. Tão tenra, serena, educada e sorridente a outra parte se mostrava. Seria uma inverdade dizer que eu não gostava desse outro Sam, mas seria igualmente mentira se eu dissesse que o primeiro não fazia meu coração pular.
De certa forma, eu gostava da urgência com que me beijava, como se fosse imprescindível. Gostava do sorriso irônico e meio malvado e os cabelos pretos rebeldes só me traziam inquietação e vontade. Já a leveza, simpatia e timidez que o possuíam de dia eram, da mesma forma, algo que me aquecia por dentro. Eu estava dividida. Dividida entre duas pessoas que, na verdade, são uma só. O quão estranho isso soa?
- Eu gosto de limão. – Ele me disse sorrindo após pedir o sorvete desse sabor. Era irônico o fato de que sua parte mais azeda gostava do doce da cereja, enquanto a parte mais terna tinha como sabor preferido o limão.
- Eu gosto de vários. Limão, cereja... – Dei de ombros.
- Um gosto muito contraditório, não acha?
- Não quando os dois sabores te satisfazem. – Sorri com cautela. Eu sabia que havia dito demais.
- Uma frase sensata.
- Achei que iria passar o dia ensaiando. – Eu dei de ombros logo após nos sentarmos em uma mesa na calçada. Estava o dia propício para um sorvete.
- A May me deu uma folga. – Ele parecia muito contente com isso. Eu, ao contrário, senti a ira me corroendo ao ouvir esse nome. – Achei que deveria te subornar com um sorvete.
- Bem sábio. Adoro sorvete. – Brinquei. – E então? O que precisa?
- Perdão? – Ele parecia muito concentrado de repente, não estava atencioso na minha pergunta.
- Você disse que está tentando me subornar. Isso deve ter um motivo. Diga-me qual é e eu digo-lhe se sua tentativa funcionou. – Sorri novamente. Eu estava muito alegre por poder ter contato com ele durante a luz do dia. É claro que Sam noturno havia me orientado a não me aproximar dele mesmo durante o dia. Além de eles terem essa relação muito forte de conseguir sentir minha presença quando não eram eles mesmos, ainda havia o fator de que ele poderia desconfiar da real situação.
- Estivemos aqui ontem?
Sim. Sam e eu havíamos saído à noite para comer (meu miojo queimou) e resolvemos passar lá para tomar a sobremesa. Ele disse que era muito agradável descobrir a cidade e sair à noite por outro motivo que não seja encontrar pistas.
- Não.
- Por que tenho a sensação de que já estive aqui com você antes?
- Provavelmente um déjà vu.
- Não, você estava diferente. – Fechou os olhos buscando a concentração e eu rezei para que se convencesse de que estava enganado. Tive que me controlar para não perguntar “você se lembra da minha roupa?” porque era, decididamente, um avanço de consciência.
- O que queria falar comigo? – Perguntei esperando que isso desviasse o assunto.
- Era sobre isso mesmo o que eu queria falar. Continuo tendo essas... Visões. – Ele foi muito cuidadoso ao escolher a palavra. – Eu compreendo que posso estar parecendo um lunático, mas acredito que você sabe do que estou falando. O brilho esperto em seus olhos a entrega.
- Tem razão, está parecendo um lunático. Não faço idéia do que pode ser. – Eu o conhecia suficiente para saber que, após uma fala dessas, o Sam que aparece à noite ficaria muito irritado e, provavelmente, discutiríamos em seguida, mas este só sorriu com calma e me observou.
- Eu sei que quer me contar. – Ele sussurrou no meu ouvido. Senti uma onda de frio percorrer pela minha espinha. Meu Deus, ele tinha um senso de persuasão que era muito bom, tive que me segurar para não ceder.
- Não.
- Não se preocupe. Terei paciência para ouvir-lhe quando estiver preparada para me dizer. – Ele disse baixinho e afastou-se ainda sorrindo triunfante.
- Quando vai me ajudar com aquele trabalho? Me levar ao seu avô eu quero dizer... – Eu estava tão aliviada por ele finalmente ter se afastado que falei tudo rapidamente, embaralhando um pouco as palavras, mas ele me entendeu. A boca dele estivera tão perto, o hálito gostoso, o cheiro doce... Faltou pouco para que eu não fizesse uma bobagem.
- Quando quiser!
- Ótimo. Podemos ir neste domingo?
- Hum, quanta pressa... – Ele disse sorridente. – Acho que posso arrumar uma desculpa para a May...
- Oh, vocês são...?
- Não, é que geralmente ela gosta de ensaiar aos domingos.
Que mulher chata. Ocupa até mesmo os finais de semana com essa história de ensaios. Ela estava era rondando, querendo-o, feito um abutre procurando a presa. Essa presa já tinha dona.
- Bem, então acho que não há outro jeito senão dizer que está gripado ou sei lá... – Eu disse triunfante, a idéia de que ele estava arrumando uma desculpa para ela só para poder ficar comigo me satisfazia por completa.
- Acho que gripes são bem comuns nessa época do ano, não concorda? – Piscou divertido.
- Totalmente.
Depois voltamos para casa e eu consegui ouvir um pedaço de “The final countdown” antes que ele aparecesse novamente, mas com outros modos. E era esse ser tão diferente e enigmático que eu estava contemplando agora, enquanto jogávamos palavras-cruzadas.
É claro que eu não contei toda a história ao Sam, relembrei somente alguns momentos importantes, como a parte em que seu alter ego estava começando a desconfiar da realidade, o que para ele representava o perigo de um colapso. Já eu, duvidava disso. Apesar de o Sam com quem eu estava agora ser, visivelmente, a parte mais forte, não acho que essa força simplesmente aparece do nada. Se essa personalidade tão ativa e misteriosa possuía toda essa energia, era de se concluir que seu outro eu também dispusesse de tal poder. Talvez só não sabia disso ainda. O meu ponto é que eu tinha certeza de que ele poderia lidar com esse fato se soubesse dele, mas não era o que o Sam pensava, então eu obedecia ao segredo.
Eu também escondi a parte sobre o avô. Eu não gostava de omitir fatos, mas eu tinha a plena certeza de que ele não me deixaria visitar sua família no Vale. Por esse motivo, eu teria que esconder essa pequena visita por algum tempo, só por algum tempo já que eu planejava contar-lhe o que fiz quando voltasse.
Eu poderia muito bem fazer-lhe perguntas sobre os tópicos que eu queria saber, mas esse assunto era sempre muito pesado, estragava nossa noite e entrávamos naquela mesma questão do “será que devemos mesmo estar juntos? Será que é certo? Isso não vai piorar as coisas, nos fazer sofrer?”
- Então eu gosto de sorvete de limão? – Ele perguntou fazendo uma careta.
- Sim, gosta muito.
- Certo, eu toco violoncelo, gosto de sorvete de limão, falo frases polidas e palavras engomadinhas... Não parece eu.
- Não mesmo. – Eu concordei ao completar a palavra “defunto” no tabuleiro. – Mas é muito interessante.
- Mesmo? – Ele pareceu muito interessado e levantou as sobrancelhas.
- Uhum. – Disse rapidamente ainda concentrada no jogo, pegando novas letrinhas sortidas dentro da caixa. Levantei a cabeça quando percebi o silêncio.
- De quem você gosta mais?
- O quê?
- De quem você mais gosta...
- De você, ué. – Dei de ombros.
- Qual... Digo, quem... Eu quem?
Ah. Era aí que ele queria chegar.
- Gosto de todos os você. – Sorri. – Eu sei que é difícil de acreditar que eu goste da mesma maneira de duas personalidades tão opostas, mas é assim que é. Não importa quem é, importa que seja você.
Ele piscou os olhos brilhantes, estava me olhando de um jeito diferente.
- Eu já te disse o quanto...? – Fechou os olhos com cautela e olhou para baixo balançando a cabeça negativamente, como se espantasse um pensamento. – Você é especial, Mel.
Eu sorri.
Saber que eu era especial para ele, quem sabe, da mesma maneira o quanto ele era especial para mim me reconfortou de uma maneira que eu fui capaz de dormir tranquilamente por horas na manhã seguinte. Era a primeira vez em muito tempo que eu consegui ter um sono tão agradável.
Aos poucos, o meu medo sobre o nosso relacionamento tão incomum iria desaparecendo. Chegou um ponto em que eu não me importava mais quantos ele conseguia ser ou o quanto era difícil poder vê-lo de dia e não poder tocar seus lábios ou sentir seus braços em torno dos meus. Era intenso e doloroso, mas quem disse que não valia à pena? A tortura da espera pelo crepúsculo era completamente sufocada pelas poucas horas em que passávamos um na companhia do outro. E, neste momento, o tempo parecia voar quando, durante a luz do dia, cada segundo parecia durar uma eternidade.
Outros receios foram surgindo através desses períodos em que a luz nos castigava. Eu sempre me julgara uma garota repleta de lógica e auto-controle. Por esse motivo, drogas nunca me atraíram. Eu simplesmente não conseguia suportar que outra coisa obtivesse controle sobre meus pensamentos, que algo me cegasse ou me dominasse a ponto de me controlar. Talvez fosse por essa razão que eu estava começando a ficar assustada com o sentimento que me arrebatava. Eu nunca tivera nenhum vício... Até aquele dia.
- Retire o pé bem devagar... – Ele disse com calma, alguns dias antes sentado no banco do passageiro de um carro novo e maravilhoso que havia comprado. Ele havia garantido que aprender a dirigir era útil, uma necessidade.
O veículo pulou.
- Eu disse devagar! – Falou rindo absurdamente da minha completa falta de aptidão no assunto.
Estávamos à noite em um estacionamento vazio. O lugar era bem grande e discreto e a loja já havia fechado. Sam disse que não haveria perigo se praticássemos lá por um tempo antes que eu fizesse o teste para conseguir a carteira de motorista.
- Eu retirei devagar! – Respondi duplamente enraivecida. Além de meu namorado estar rindo de mim, aquele carro simplesmente não me obedecia. – Foi devagar! – Eu resmunguei dando batidinhas de ódio no volante.
Ao que pareceu, isso só contribuiu com o aumento dos risos vindo do jovem sentado ao meu lado.
- Calma.
- Eu estou calma.
- Não está. – Disse controlando o ataque de risos. – Você está fazendo bico.
- Acho melhor desistirmos. – Cruzei os braços. Afinal: quem precisava saber dirigir quando se tinha ônibus e metrôs lotados em uma cidade?
- Não mesmo. Você é esperta, vai conseguir. – Ele sorriu novamente, abriu a porta do lado do passageiro e saiu.
- Aonde você vai? – Eu gritei me esticando para a direita para ver o que ele estava fazendo. Fiquei um pouco assustada quando a porta do motorista abriu-se bruscamente.
- Chegue para lá. – Ele disse com divertimento, sentou-se no banco do condutor e fechou a porta, meu primeiro instinto foi tentar passar para o assento ao lado deste, mas ele segurou minha mão. – O que está fazendo? Me ver dirigindo não vai te ajudar em nada. Algumas coisas só se aprendem com a prática. Vem cá.
Eu sentei em seu colo. Seria uma coisa normal se não estivéssemos em uma situação tão estranha com o espaço tão limitado. Meu coração começou a disparar, era muito contato e foi então que eu percebi que eu não tinha tanto auto-controle quanto pensei que tinha, já que eu não conseguia me focar na aula.
Ele, ao contrário, pareceu bem à vontade. Não fazia muito movimento e também não aproveitava a situação para encostar-se em locais que me fariam corar. Lentamente, arrastou meus cabelos para o outro lado e encostou o rosto próximo à minha nuca.
- Aperte aquele pedal.
- Como você espera que eu faça isso?
Era uma pergunta bem coerente, já que eu já era baixa e, sozinha, já tinha dificuldades para alcançar os lugares certos. Agora que eu estava quase encostando a cabeça no teto do carro, parecia bem mais que impossível.
- Certo, vamos fazer diferente. – Ele disse pensativo e afastou um pouco as pernas. – Sente-se direito. – Ele disse depois que colocou o banco um pouco mais para trás, dando-nos mais espaço. Eu me sentei diretamente no estofado, agora conseguia alcançar os pedais, mas a respiração dele, agora mais perto da minha nuca, não me ajudava em nada. – Consegue agora?
- Sim.
- Ótimo, agora tente se concentrar.
Difícil.
Aos poucos, estava conseguindo me acostumar com ele ali, tão perto. Mas foi então que eu percebi que o que me instigava de maneira tão avassaladora não era a grande quantidade de contato tão íntimo. Era a maneira como ele me explicava pacientemente o que eu deveria fazer. Como segurava a minha mão com calma enquanto me mostrava a maneira correta de passar uma marcha ou segurar no volante. O jeito como não se atreveu a tirar vantagem disso para forçar alguma coisa. Isso era o que mais significava para mim, o respeito e o carinho com que me tratava, pela primeira vez, lembrou seu outro ego.
Embora a percepção disso tenha me fascinado e me feito perder o foco temporariamente do que eu estava aprendendo, ao mesmo tempo, me atemorizou. Foi aquele mesmo sentimento da perda do controle. Foi quando eu notei que o que eu sentia me dominava, tomou conta de mim e eu nem sequer havia notado. Não havia percebido até aquele momento que eu adquirira um vício. Eu caíra nas armadilhas e teias do amor. E não poderia fugir.
Foi relembrando esse momento e o da noite passada, quando estávamos jogando palavras-cruzadas no tabuleiro, que eu consegui ter um sono pleno e calmo. Levantei-me com um susto e pulei para fora da cama, estava atrasadíssima... De novo.
Vesti-me de qualquer modo, joguei uma água no rosto e escovei os dentes em velocidade recorde. Não que eu já não fosse acostumada a chegar atrasada em, praticamente, todos os dias de aula, mas daquela vez seria diferente. Eu teria prova final do bimestre no primeiro horário e, chegar atrasada, faria minha nota despencar, o que era incomum.
- Achei que não iria acordar mais. – Eu cheguei na sala e Sofia informou tranquilamente enquanto passava requeijão em uma torrada industrializada.
- Por que você não me acordou? – Deixei a ira transparecer na voz. Eu estava, realmente, chateada por ter uma irmã que não pensa que chegar atrasada poderia me causar problemas.
- Porque você não pediu. – Ela deu de ombros e continuou lambuzando a torrada. – Além do mais, ainda estou protestando contra a sua desorganização. Não vou entrar lá enquanto não arrumar tudo. – Deu uma mordida no alimento.
- Você não está apressada? Você odeia se atrasar. – Eu resmunguei enquanto ficava de um pé só para colocar o tênis.
- Verdade. – Ela disse ainda calmamente, estava fazendo de propósito. – Mas eu não tenho nada muito importante hoje.
Meu olhar furioso perfurou sua nuca.
- Não adianta me olhar assim. – Ela disse ainda sem se virar. Estava sentada à mesa de costas para mim e parecia não se importar muito. – O erro foi seu.
- Eu tenho prova no primeiro turno, Sofia! – Disse em voz alta esperando que ela, pelo menos, olhasse para mim enquanto estivesse falando comigo. Ela atritou uma mão na outra para retirar os farelos e levantou-se.
- Eu já estou pronta. – Disse com delicadeza e esperou perto da porta.
Acho que ela estava tentando a tática que mamãe costumava usar quando fazíamos algo que a aborrecia. Certamente, os atrasos incomodavam Sofie e ela, inteligente como sempre, havia percebido de que se esgoelar contra mim não estava adiantando, já que não poderia ir à escola sozinha. Então deveria estar tentando outra estratégia que é a de fingir indiferença na esperança de que eu mesma perceba meu erro. Estava funcionando. Era, simplesmente, irritante estar atrasada e preocupada ao lado de alguém que parece não se importar.
- Acha que vamos chegar em tempo? – Eu perguntei mais calma enquanto trancava a porta.
- Depende... Você é um jamaicano com um número nas costas? – Ela perguntou com desdém enquanto, de novo, descíamos as escadas por estarmos atrasadas demais para esperar o elevador.
Ás vezes o destino é tão irônico que prega a mesma peça duas vezes e, nessas horas, as pessoas que diziam que um raio nunca cai duas vezes no mesmo lugar notam que estão enganadas.
Novamente, a pressa me fez dar de cara com um vizinho. E, como nada acontece por coincidência, não poderia ser outra pessoa diferente.
- Você nunca aprende, não é? – Sam perguntou com divertimento enquanto segurava meu pulso para evitar uma possível queda. Eu que havia me desequilibrado, claro, ele pareceu nem sentir o impacto.
- Parece que não. – Sorri. – Desculpa, depois conversamos, estamos sem tempo! – Eu disse rapidamente e voltei ao meu trajeto.
- Eu levo vocês, acabei de chegar e não tenho outra ocupação nesta manhã.
Sofia parou de andar na mesma hora e disse:
- Ótimo.
Eu congelei como estátua no momento em que ouvi as palavras. Teria sido um ótimo evento visto que ir com ele certamente nos pouparia tempo e permitiria que eu fizesse a prova, mas eu pensei nas possibilidades. Sofia não fazia idéia do problema do Sam e, ironicamente, nem ele mesmo sabia, o que tornava tudo uma situação muito delicada.
Sofie nunca tivera contato com essa personalidade do Sam, salvo por aquela primeira vez que nos trombamos nas escadas em contextos muito semelhantes. Era natural que ela comentasse alguma coisa com ele, por exemplo, perguntar que fim levou nossas aulas de direção antes de ontem. Ele, por sua vez, não entenderia nada e, aí sim, teria certeza de que eu sei algo que não quero lhe contar.
- Não precisa. – Eu tentei me expressar sem parecer que uma onda fria de pavor corria pelo meu corpo.
- Você não tem que chegar cedo para fazer uma prova?
- Podemos chegar a tempo se formos à pé, Sofie. Vamos.
Sam olhou no relógio de pulso.
- Não conseguirão. Vamos, eu as levo. – Mudou imediatamente o curso de subida e passou a descer conosco até o estacionamento antes que eu pudesse dizer uma palavra.
Era uma situação muito delicada, já que eu deveria escolher entre chegar atrasada e perder uma prova ou arruinar tudo se minha irmã resolvesse abrir a boca, o que era bastante provável que faria. Ao mesmo tempo, se eu negasse insistentemente a carona, ele poderia desconfiar ainda mais dos motivos que me levariam a preferir andar quarteirões e chegar atrasada a passar alguns minutos com ele.
Chegamos ao estacionamento e fomos em direção a uma gigante moto preta que estava depositada em uma das vagas. Lembrei-me da vez em que andei nela, parecia tanto tempo atrás. Eu achei muito estranho, mas logo ele se desviou e abriu um carro prateado que estava parado a poucos metros de distância do veículo de duas rodas mais bonito que eu já vira.
- Aquela moto é bem legal, não acha?
- Muito.
- Eu teria uma se fizesse o estilo radical. – Ele falou antes de abrir a porta para mim e esperar que eu entrasse. Coloquei a mão direita sobre a testa e fechei os olhos, que má escolha aceitar esse convite.
Ele também abriu a porta para Sofia, que agradeceu com muita educação e logo deu a partida. Notei que era também um carro muito bonito, mas não era o veículo preto em que estivemos apertados em um estacionamento na noite anterior ao sorvete. Sam nem deveria saber que tinha dois carros e uma moto.
Deu a partida e dirigiu tranqüilo pelo trânsito que, geralmente, levava Sarah á loucura. E eu tinha a certeza de que eram poucas as pessoas que conseguiam manter a calma quando estavam dirigindo. O fato é que, mesmo na velocidade baixa em que ele dirigia, iríamos conseguir chegar à tempo ao colégio. Isso era o que importava, eu acho.
- Gosta dessa música?
- É bem legal. – Eu respondi. Decidi que o mais sensato seria conversar bastante para evitar que Sofia falasse muito. – Apesar de que eu prefiro o álbum anterior deles. Quero dizer, a banda tinha um estilo bem mais original nos outros discos e agora parece que está tentando aprimorar o som, mas está caindo naquele ponto clichê das bandas desse tipo.
- Concordo. É bem comum que algumas bandas desistam do som próprio proposto no princípio para tentar se adequar à moda. Uma pena. – Respondeu amigavelmente enquanto prestava atenção no tráfego.
- Também acho.
- E você Sofia? O que acha? – Ele perguntou sorridente olhando pelo retrovisor para encarar a minha irmã que parecia bem compenetrada nos próprios pensamentos e não estava falando muito, ainda bem.
- Não gosto de música.
- Ele estuda música. – Eu falei irritada com a falta de senso da minha irmã, mas depois me arrependi.
Ela, ao contrário do esperado, não ficou envergonhada pelo comentário, só nos encarou e disse:
- Que péssimo para ele então.
- Sofia...
- O quê? As pessoas se dedicam às artes como uma maneira de se expressar ou até de promover algum tipo de relaxamento ou terapia. Eu não preciso disso, eu tenho a física. Nem todo mundo canta no chuveiro, Mellanie. – Me lançou aquele olhar de censura que me fez corar.
- O que você canta? – Sam pareceu achar divertida essa revelação tão embaraçosa sobre a minha pessoa. Eu mal sabia cantar, era só por instinto ou sei lá.
- Nada. Ela está inventando.
- O quê? Eu não minto! – Ela protestou. – Qualquer pessoa em um raio de um quilômetro sabe que estou falando a verdade. Ele é nosso vizinho, deve te ouvir.
- Na verdade não. – Ele respondeu ainda sorrindo, mas franziu as sobrancelhas.
Eu costumava tomar banho à noite, depois que chegava dos estudos com a Rebecca e antes da novela. Justamente o horário em que ele pensava que estava dormindo. Resolvi não responder para não prolongar o assunto onde estávamos chegando a um ponto perigoso. Ficamos em silêncio por algum tempo.
- Você ainda tem alergia a cães, Sofia? – Ele perguntou tentando, obviamente, recuperar o bom clima dentro do carro. Esse assunto era, de maneira definitiva, mais perigoso que o anterior, visto que ela enchia os ouvidos de qualquer um quando o assunto era a alergia.
- Ainda. É por isso que eu sempre peço para você passar anti-séptico nas mãos quando aparece lá em casa. – Ela respondeu um pouco impaciente por ele, aparentemente, não entender a genialidade dela ao pensar em um modo saudável com que ele pudesse nos visitar sem transmitir agentes que a deixariam inchada por horas.
Eu tremi. Meu corpo inteiro tremeu, por dentro e por fora. O suor frio tomou conta das minhas mãos. Fechei os olhos esperando algum milagre, mas eu saberia que ninguém deixaria de fazer perguntas quando lhe dizem que esteve em algum lugar em que não se lembra.
- Quando foi a última vez que estive lá? – Ele perguntou assustado, aproveitando o semáforo na luz vermelha para analisar o rosto despreocupado da Sofia.
- Ontem.
Fim da parte 1
Eu realmente não sabia se concentrava meus esforços em tentar respirar ou em tentar não vomitar. De repente, parecia que tudo o que eu havia comido naquele dia estava retornando.
Meu pai estava morto há mais de seis anos. Seis longos anos. Seis torturantes anos. Deveria ser uma brincadeira de muito mau gosto, no mínimo, um imbecil querendo passar algum trote. Era nisso que eu queria acreditar.
Não fazia sentido que, do nada, ele me deixara uma encomenda. O que ele haveria de querer que eu recebesse quando fizesse dezoito anos? E por que ele supôs que não estaria vivo para, ele mesmo, me entregar esse pacote, seja lá o que for? Quero dizer, quem é que prevê a própria morte? Eu não queria pensar nisso.
Tentei concentrar-me em outra coisa, qualquer outra coisa. Não adiantou, minha cabeça ainda estava dando voltas e meu estômago revirava quase no mesmo compasso.
Deitei-me com cautela no sofá da sala e percebi os movimentos rápidos do Sam para buscar um copo d’água ou retirar a minha franja da frente do meu rosto. Pude sentir seu olhar preocupado me analisando, como se fizesse um raio-x para tentar descobrir o que havia de errado comigo.
E o que havia de errado comigo?
Eu certamente poderia responder. Meu pai morto me deixara uma encomenda. Como se já não fora doloroso o bastante seguir em frente e tentar esquecer a perda, agora alguém fizera questão de revirar um passado que eu havia lutado para enterrar. Isso era o que havia de errado comigo.
- Está tudo bem. – Ele tentou sorrir e acariciou meus cabelos. Acho que ele tinha entendido o que eu estava sentindo.
Minha visão finalmente começou a entrar em foco e consegui ver Sofie lendo a carta cuidadosamente, como se a estivesse digerindo e lutando para não deixar escapar nem um pedaço sequer. Ela estava muito concentrada e apoiava os dedos da mão direita sobre o queixo, prova número um de que estava raciocinando.
- Você acha que ele também me deixou algo? – Ela perguntou muito assustada, estava mais branca do que o normal.
- Ótimo. Vamos esperar cinco anos para descobrir. – Eu resmunguei em meio ao nervosismo. Agora que estava conseguindo enxergar melhor, percebi que as minhas mãos estavam tremendo.
- Vamos mudar de assunto. Sofia, guarde isto. – Sam ordenou e ela obedeceu, enfiando a carta dentro de uma das gavetas da estante da sala. Em seguida, jogou-se na cadeira na qual estivera sentada minutos antes. – Ainda está tonta? – Ele, que estava ajoelhado ao lado do sofá, aproximou-se ainda mais de mim.
- Eu estou bem.
- Não, não está. – Ele me lançou o olhar de preocupação que me deixava aborrecida. Esse olhar diminuía o verde claro dos olhos, tornando-os mais melancólicos e escuros. – Mas vai ficar.
- Podemos parar de bancar o Barney e seus Amigos e nos ater a real situação? – Sofia perguntou impacientemente.
- O quê? Você acha que estou contente? – Eu sorri ao pensar nessa ironia. Certamente, minha irmã estava pensando que eu estava feliz com isso, que não era nada difícil enfrentar o passado batendo novamente à sua porta, literalmente.
- Não foi o que eu disse. Só estou dizendo que esse seu ataque de nostalgia não está ajudando em nada.
- Sofia... – Sam alertou-a de que estava passando dos limites.
- Eu não estou brincando. Não é motivo para ficar desse jeito. Provavelmente é só alguma coisa que ele guardou para ela.
- E por que ele quis que eu o recebesse só agora?
- Não sei. Como você espera que eu leia os pensamentos de alguém que mal conheci? – Ela se irritou e saiu marchando. O barulho dos seus passos só parou quando foram interrompidos pela batida da porta do quarto.
- Ela acha que estou exagerando. – Eu constatei com amargura.
Eu sabia o porquê de Sofia pensar nisso, ela não sabia a história completa. Se o que estava escrito naquela carta fosse verdade, era, provavelmente, o motivo de estarem me perseguindo. Era isso o que eles queriam... Mas o que poderia ser?
- Ela não sabe o que diz. – Ele sorriu e beijou minha testa. – Acalme-se. Nada vai acontecer a você.
- Eu só... Não entendo.
- Diga-me o que você não entende. – Sam falou enquanto beijava meus cabelos com cautela. Senti sua respiração muito perto.
- Por que eu? O que eu posso receber de tão importante? Se é isso o que querem, podem ficar. Eu não faço questão alguma.
- Você não sabe o que é. – Ele tinha razão nessa.
- Não acho que seja algo que valha mais do que a segurança da minha família. Se entregar essa encomenda assegurar que eu me livrarei desses problemas, serei a primeira a dá-la a eles.
- Você não pode fazer isso... – Ele levantou meu tronco com leveza e sentou-se no sofá. Apoiei minha cabeça em seu colo enquanto ele continuava a acariciar os cabelos.
- Claro que eu posso. Eu não quero essa herança.
- Se o seu pai quis que fosse entregue somente para você aos 18 anos, significa que ele acreditou que você teria responsabilidade o suficiente para guardá-la com sabedoria. Pense nisso.
Eu olhei para cima e encarei seu rosto dolorosamente bonito. Era incrível como eu odiava quando ele estava certo. Apesar desse pacote que o meu pai me deixou ser, na maior probabilidade, o objeto que está nos colocando em perigo, era algo que ele me deixara por alguma razão. Eu não poderia simplesmente entregar para essas pessoas capazes até de vasculhar a minha casa inteira em sua procura. Quero dizer, como poderia entregar o ouro ao bandido? Por outro lado, como poderia colocar a segurança da minha família em risco? Certo, talvez eu estivesse arrependida de reclamar tanto da minha vida outrora pacata.
Eu fiquei imersa nesses pensamentos por muitos minutos, Sam não reclamou. Ele só continuou a brincar com meus cabelos enquanto eu me postava com a cabeça apoiada em seu colo.
Levou algum tempo para que eu pudesse organizar meus pensamentos e pensar nos meus próximos passos. Eu não contaria nada a ninguém, pediria a Sofie para manter o segredo. Eu decidi, finalmente, por esperar e ver o que acontece. Não há como eu decidir o que fazer antes que eu saiba o que é essa ”coisa”. Quero dizer, um covarde morre diversas vezes antes de, realmente, morrer. Ficar agonizando antes de ter certeza da real situação e ficar sofrendo por meras hipóteses só iria me fazer sofrer infinitas vezes antes de, se for o caso, ter que fazer uma escolha.
- Está tarde.
- Fique mais um pouco.
- Você sabe que não posso.
Ele disse com muita cautela, mas eu percebi a tristeza que sentiu por não poder ficar e me dar mais apoio. Eu havia esquecido completamente da hora e me senti culpada por ter feito o pedido sabendo que o entristecia profundamente não poder acatá-lo.
- Tudo bem. – Eu tentei sorrir, mas as veias na minha testa ainda estavam latejando. Iria ser uma péssima noite.
- Não precisa fingir que está tudo bem. – Ele falou antes de se levantar e caminhar em direção à porta.
- Eu já fiz a escolha, Sam. E escolhi você.
- Só estou dizendo que este é um exemplo típico do que eu havia dito noite passada. Há limites.
- Se eu me importasse, não estaria dizendo até amanhã. – Aproximei-me e beijei-lhe os lábios quentes. Era isso o que me dava forças para continuar.- Até amanhã.
Ele sorriu.
Não tive uma boa noite de sono, na verdade, mal consegui dormir. Embora tenha decidido esperar para saber o que me fora deixado em circunstâncias tão irreais, era difícil me concentrar em outra coisa.
Minha noite intercalava momentos de pesadelos e momentos de insônia. Um pouco cruel, mas nada que pudesse me fazer desistir. Eu havia ganhado um novo vigor, uma espécie de nova energia que me impulsionava a continuar. Uma voz no fundo de minha consciência dizendo-me que, no final, tudo daria certo.
De uma hora para outra, alguns buracos me furavam o ser. Esse perigo iminente, essa volta inusitada de algo que já deveria ter ficado para trás produziu esse efeito em mim. O mais estranho era que, ao mesmo tempo, eu era capaz de sentir que eu tinha alguém em quem confiar. Um porto seguro. Não era que eu precisasse de defesa, mas não creio que conseguiria suportar tudo se estivesse sozinha, se não sentisse o calor de seus olhos verdes perfurando a minha pele e tocando minha alma.
Para melhorar um pouco a situação, as coisas no colégio estavam ficando menos tensas. Muitos dos alunos haviam parado de me encarar, embora uma vez ou outra eu recebesse pedidos para autografar alguns cadernos cor-de-rosa de algumas meninas da sexta série. Eu gostava disso. Não porque elas, por algum motivo, me admiravam, mas porque eu havia descoberto que eram boas pessoas, então eu sempre fazia questão de dizer algumas frases de incentivo para que continuassem assim no futuro. Chega de Petrys no mundo.
Alguns dias se passaram com extrema rapidez. Eu havia descoberto que o tempo parece voar quando você se perde em pensamentos, principalmente em aulas monótonas. É claro que eu tentava me focar em outras reflexões, mas, ora ou outra, não conseguia evitar perguntar a mim mesma o que meu pai poderia ter guardado para mim e feito questão de que eu, e somente eu, recebesse aos 18 anos.
Sam percebia muitas vezes a minha distração, principalmente nos momentos em que jogávamos palavras cruzadas de tabuleiro.
- “Pacote, entrega, final, tempo, pai, vida”. Tem certeza de que não quer conversar sobre isso?
- Sobre o quê?
Eu sabia que minhas tentativas de fingir que não sabia do que ele estava falando eram fracassadas, mas eu também tinha certeza de que ele não insistiria.
Estávamos aprendendo um com o outro. Eu havia crescido em múltiplos aspectos, como por exemplo, tinha aprendido a ceder. Claro que gostávamos de discutir às vezes para ver quem escolheria o restaurante – sim, de vez em quando cansávamos dos enlatados – quem compraria o sorvete, ou quem alugaria o filme, mas o importante é que descobrimos que não havia porque alguém ganhar sempre. Então intercalávamos os desejos, já que éramos dois cabeças-duras.
Eu tinha autoridade, ele também tinha. Ele me protegia, eu também fazia isso. Nosso relacionamento não era complementar, era suplementar. Porque juntos, não completávamos um ao outro como duas peças de quebra-cabeças, mas crescíamos e nos tornávamos mais fortes. Eu desconfiava seriamente de que esse era o principal motivo pelo qual meu sentimento não diminuía, mas pelo contrário. E, para falar a verdade, isso me deixava angustiada.
Quando eu revejo os meus sentimentos de nervosismo perante esse fato inegável – o de que o que eu sentia só vinha crescendo – penso no que Rebecca provavelmente diria: “você enlouqueceu? Por que ter alguém perfeito para você te deixa angustiada?”, mas eu tenho uma boa explicação para esse fato incomum.
Eu sei que, hoje em dia, falar “eu te amo” tornou-se algo mais que comum, o tipo de coisa que qualquer pessoa fala para outra diante de qualquer situação. O tipo de frase que todos acham bonita demais para enfeitar depoimentos de páginas de relacionamentos na internet, ou que, simplesmente, têm uma pronúncia bacana que todos gostam de ouvir.
É certo que todos gostam de saber que são amados, mas o meu problema é que eu me recuso a dizer tais palavras se não tiver certeza do pleno significado que elas têm. Amor, ao contrário do senso comum, não é gostar muito de alguém. Dizer “eu te amo” acarreta muito mais responsabilidade do que muitos podem pensar. É estar lá quando o outro precisa, é colocar-se no lugar dele, é respeitar, ajudar, guiar, saber ouvir e, acima de tudo, pensar no outro antes de em você mesmo. É por esse motivo que eu preferia minha morte à de Sofia. É pelos mesmos motivos que tenho certeza de que amo meus dois melhores amigos. Resumindo, é algo muito profundo e intenso para ser dito levianamente.
Eu nunca havia falado estas palavras para alguém antes, não no sentido amoroso. Como tudo em minha vida fora muito passageiro nesse sentido, era um assunto muito delicado com o qual eu, admito, não sabia realmente como lidar. Foi daí que surgiu o nervosismo.
Começou tímido, com as pernas trêmulas e o arrepio na espinha. Cada dia que s
e passava, tornava-se mais intenso e inevitável. Era difícil escondê-lo ou fugir dele. Estava incrustado em mim.
- Estive com você hoje à tarde. – Falei eventualmente, colocando a letra “R” para formar a palavra “Segredo”.
- Eu tive uma pequena impressão de que isso havia acontecido. Como você não comentou nada até agora, pensei que havia imaginado.
- Não imaginou, estivemos sim juntos.
- O que eu fiz? Te encontrei no elevador? – Ele perguntou distraído enquanto analisava as letras que ele ainda tinha na caixa para pensar em alguma palavra.
- Não. – Eu olhei para cima. – Me levou para tomar sorvete.
Ele parou de observar as letras na mesma hora e me encarou com seriedade.
- Nunca achei que teria ciúmes de mim mesmo. – Sorriu com o humor negro.
Eu era capaz de compreender este sentimento. Não era preciso que ele o verbalizasse para que eu soubesse o quanto Sam sofria por não poder estar por perto o tempo todo. O quanto se sentia um lixo por ser um namorado pela metade. E, pior, se sentia um monstro por não conseguir se livrar do sentimento de vingança que o assolava.
Era um pouco obscuro pensar nesse assunto. Havia muitas coisas que me assustavam. Eu, definitivamente, não era a favor da violência e, tudo o que eu queria, era que ele parasse com o rancor e ocupasse esse espaço pelo que sentia por mim. Não se pode ter tudo.
Parece, na verdade, irônico dizer que ele tinha uma face totalmente inversa. Porque, ao lembrar-me dos momentos que passamos juntos hoje na sorveteria, eu percebia que não havia ódio, não havia vingança, não havia terror, urgência, trevas ou perigo estampados nos olhos cor de oliva. Tão tenra, serena, educada e sorridente a outra parte se mostrava. Seria uma inverdade dizer que eu não gostava desse outro Sam, mas seria igualmente mentira se eu dissesse que o primeiro não fazia meu coração pular.
De certa forma, eu gostava da urgência com que me beijava, como se fosse imprescindível. Gostava do sorriso irônico e meio malvado e os cabelos pretos rebeldes só me traziam inquietação e vontade. Já a leveza, simpatia e timidez que o possuíam de dia eram, da mesma forma, algo que me aquecia por dentro. Eu estava dividida. Dividida entre duas pessoas que, na verdade, são uma só. O quão estranho isso soa?
- Eu gosto de limão. – Ele me disse sorrindo após pedir o sorvete desse sabor. Era irônico o fato de que sua parte mais azeda gostava do doce da cereja, enquanto a parte mais terna tinha como sabor preferido o limão.
- Eu gosto de vários. Limão, cereja... – Dei de ombros.
- Um gosto muito contraditório, não acha?
- Não quando os dois sabores te satisfazem. – Sorri com cautela. Eu sabia que havia dito demais.
- Uma frase sensata.
- Achei que iria passar o dia ensaiando. – Eu dei de ombros logo após nos sentarmos em uma mesa na calçada. Estava o dia propício para um sorvete.
- A May me deu uma folga. – Ele parecia muito contente com isso. Eu, ao contrário, senti a ira me corroendo ao ouvir esse nome. – Achei que deveria te subornar com um sorvete.
- Bem sábio. Adoro sorvete. – Brinquei. – E então? O que precisa?
- Perdão? – Ele parecia muito concentrado de repente, não estava atencioso na minha pergunta.
- Você disse que está tentando me subornar. Isso deve ter um motivo. Diga-me qual é e eu digo-lhe se sua tentativa funcionou. – Sorri novamente. Eu estava muito alegre por poder ter contato com ele durante a luz do dia. É claro que Sam noturno havia me orientado a não me aproximar dele mesmo durante o dia. Além de eles terem essa relação muito forte de conseguir sentir minha presença quando não eram eles mesmos, ainda havia o fator de que ele poderia desconfiar da real situação.
- Estivemos aqui ontem?
Sim. Sam e eu havíamos saído à noite para comer (meu miojo queimou) e resolvemos passar lá para tomar a sobremesa. Ele disse que era muito agradável descobrir a cidade e sair à noite por outro motivo que não seja encontrar pistas.
- Não.
- Por que tenho a sensação de que já estive aqui com você antes?
- Provavelmente um déjà vu.
- Não, você estava diferente. – Fechou os olhos buscando a concentração e eu rezei para que se convencesse de que estava enganado. Tive que me controlar para não perguntar “você se lembra da minha roupa?” porque era, decididamente, um avanço de consciência.
- O que queria falar comigo? – Perguntei esperando que isso desviasse o assunto.
- Era sobre isso mesmo o que eu queria falar. Continuo tendo essas... Visões. – Ele foi muito cuidadoso ao escolher a palavra. – Eu compreendo que posso estar parecendo um lunático, mas acredito que você sabe do que estou falando. O brilho esperto em seus olhos a entrega.
- Tem razão, está parecendo um lunático. Não faço idéia do que pode ser. – Eu o conhecia suficiente para saber que, após uma fala dessas, o Sam que aparece à noite ficaria muito irritado e, provavelmente, discutiríamos em seguida, mas este só sorriu com calma e me observou.
- Eu sei que quer me contar. – Ele sussurrou no meu ouvido. Senti uma onda de frio percorrer pela minha espinha. Meu Deus, ele tinha um senso de persuasão que era muito bom, tive que me segurar para não ceder.
- Não.
- Não se preocupe. Terei paciência para ouvir-lhe quando estiver preparada para me dizer. – Ele disse baixinho e afastou-se ainda sorrindo triunfante.
- Quando vai me ajudar com aquele trabalho? Me levar ao seu avô eu quero dizer... – Eu estava tão aliviada por ele finalmente ter se afastado que falei tudo rapidamente, embaralhando um pouco as palavras, mas ele me entendeu. A boca dele estivera tão perto, o hálito gostoso, o cheiro doce... Faltou pouco para que eu não fizesse uma bobagem.
- Quando quiser!
- Ótimo. Podemos ir neste domingo?
- Hum, quanta pressa... – Ele disse sorridente. – Acho que posso arrumar uma desculpa para a May...
- Oh, vocês são...?
- Não, é que geralmente ela gosta de ensaiar aos domingos.
Que mulher chata. Ocupa até mesmo os finais de semana com essa história de ensaios. Ela estava era rondando, querendo-o, feito um abutre procurando a presa. Essa presa já tinha dona.
- Bem, então acho que não há outro jeito senão dizer que está gripado ou sei lá... – Eu disse triunfante, a idéia de que ele estava arrumando uma desculpa para ela só para poder ficar comigo me satisfazia por completa.
- Acho que gripes são bem comuns nessa época do ano, não concorda? – Piscou divertido.
- Totalmente.
Depois voltamos para casa e eu consegui ouvir um pedaço de “The final countdown” antes que ele aparecesse novamente, mas com outros modos. E era esse ser tão diferente e enigmático que eu estava contemplando agora, enquanto jogávamos palavras-cruzadas.
É claro que eu não contei toda a história ao Sam, relembrei somente alguns momentos importantes, como a parte em que seu alter ego estava começando a desconfiar da realidade, o que para ele representava o perigo de um colapso. Já eu, duvidava disso. Apesar de o Sam com quem eu estava agora ser, visivelmente, a parte mais forte, não acho que essa força simplesmente aparece do nada. Se essa personalidade tão ativa e misteriosa possuía toda essa energia, era de se concluir que seu outro eu também dispusesse de tal poder. Talvez só não sabia disso ainda. O meu ponto é que eu tinha certeza de que ele poderia lidar com esse fato se soubesse dele, mas não era o que o Sam pensava, então eu obedecia ao segredo.
Eu também escondi a parte sobre o avô. Eu não gostava de omitir fatos, mas eu tinha a plena certeza de que ele não me deixaria visitar sua família no Vale. Por esse motivo, eu teria que esconder essa pequena visita por algum tempo, só por algum tempo já que eu planejava contar-lhe o que fiz quando voltasse.
Eu poderia muito bem fazer-lhe perguntas sobre os tópicos que eu queria saber, mas esse assunto era sempre muito pesado, estragava nossa noite e entrávamos naquela mesma questão do “será que devemos mesmo estar juntos? Será que é certo? Isso não vai piorar as coisas, nos fazer sofrer?”
- Então eu gosto de sorvete de limão? – Ele perguntou fazendo uma careta.
- Sim, gosta muito.
- Certo, eu toco violoncelo, gosto de sorvete de limão, falo frases polidas e palavras engomadinhas... Não parece eu.
- Não mesmo. – Eu concordei ao completar a palavra “defunto” no tabuleiro. – Mas é muito interessante.
- Mesmo? – Ele pareceu muito interessado e levantou as sobrancelhas.
- Uhum. – Disse rapidamente ainda concentrada no jogo, pegando novas letrinhas sortidas dentro da caixa. Levantei a cabeça quando percebi o silêncio.
- De quem você gosta mais?
- O quê?
- De quem você mais gosta...
- De você, ué. – Dei de ombros.
- Qual... Digo, quem... Eu quem?
Ah. Era aí que ele queria chegar.
- Gosto de todos os você. – Sorri. – Eu sei que é difícil de acreditar que eu goste da mesma maneira de duas personalidades tão opostas, mas é assim que é. Não importa quem é, importa que seja você.
Ele piscou os olhos brilhantes, estava me olhando de um jeito diferente.
- Eu já te disse o quanto...? – Fechou os olhos com cautela e olhou para baixo balançando a cabeça negativamente, como se espantasse um pensamento. – Você é especial, Mel.
Eu sorri.
Saber que eu era especial para ele, quem sabe, da mesma maneira o quanto ele era especial para mim me reconfortou de uma maneira que eu fui capaz de dormir tranquilamente por horas na manhã seguinte. Era a primeira vez em muito tempo que eu consegui ter um sono tão agradável.
Aos poucos, o meu medo sobre o nosso relacionamento tão incomum iria desaparecendo. Chegou um ponto em que eu não me importava mais quantos ele conseguia ser ou o quanto era difícil poder vê-lo de dia e não poder tocar seus lábios ou sentir seus braços em torno dos meus. Era intenso e doloroso, mas quem disse que não valia à pena? A tortura da espera pelo crepúsculo era completamente sufocada pelas poucas horas em que passávamos um na companhia do outro. E, neste momento, o tempo parecia voar quando, durante a luz do dia, cada segundo parecia durar uma eternidade.
Outros receios foram surgindo através desses períodos em que a luz nos castigava. Eu sempre me julgara uma garota repleta de lógica e auto-controle. Por esse motivo, drogas nunca me atraíram. Eu simplesmente não conseguia suportar que outra coisa obtivesse controle sobre meus pensamentos, que algo me cegasse ou me dominasse a ponto de me controlar. Talvez fosse por essa razão que eu estava começando a ficar assustada com o sentimento que me arrebatava. Eu nunca tivera nenhum vício... Até aquele dia.
- Retire o pé bem devagar... – Ele disse com calma, alguns dias antes sentado no banco do passageiro de um carro novo e maravilhoso que havia comprado. Ele havia garantido que aprender a dirigir era útil, uma necessidade.
O veículo pulou.
- Eu disse devagar! – Falou rindo absurdamente da minha completa falta de aptidão no assunto.
Estávamos à noite em um estacionamento vazio. O lugar era bem grande e discreto e a loja já havia fechado. Sam disse que não haveria perigo se praticássemos lá por um tempo antes que eu fizesse o teste para conseguir a carteira de motorista.
- Eu retirei devagar! – Respondi duplamente enraivecida. Além de meu namorado estar rindo de mim, aquele carro simplesmente não me obedecia. – Foi devagar! – Eu resmunguei dando batidinhas de ódio no volante.
Ao que pareceu, isso só contribuiu com o aumento dos risos vindo do jovem sentado ao meu lado.
- Calma.
- Eu estou calma.
- Não está. – Disse controlando o ataque de risos. – Você está fazendo bico.
- Acho melhor desistirmos. – Cruzei os braços. Afinal: quem precisava saber dirigir quando se tinha ônibus e metrôs lotados em uma cidade?
- Não mesmo. Você é esperta, vai conseguir. – Ele sorriu novamente, abriu a porta do lado do passageiro e saiu.
- Aonde você vai? – Eu gritei me esticando para a direita para ver o que ele estava fazendo. Fiquei um pouco assustada quando a porta do motorista abriu-se bruscamente.
- Chegue para lá. – Ele disse com divertimento, sentou-se no banco do condutor e fechou a porta, meu primeiro instinto foi tentar passar para o assento ao lado deste, mas ele segurou minha mão. – O que está fazendo? Me ver dirigindo não vai te ajudar em nada. Algumas coisas só se aprendem com a prática. Vem cá.
Eu sentei em seu colo. Seria uma coisa normal se não estivéssemos em uma situação tão estranha com o espaço tão limitado. Meu coração começou a disparar, era muito contato e foi então que eu percebi que eu não tinha tanto auto-controle quanto pensei que tinha, já que eu não conseguia me focar na aula.
Ele, ao contrário, pareceu bem à vontade. Não fazia muito movimento e também não aproveitava a situação para encostar-se em locais que me fariam corar. Lentamente, arrastou meus cabelos para o outro lado e encostou o rosto próximo à minha nuca.
- Aperte aquele pedal.
- Como você espera que eu faça isso?
Era uma pergunta bem coerente, já que eu já era baixa e, sozinha, já tinha dificuldades para alcançar os lugares certos. Agora que eu estava quase encostando a cabeça no teto do carro, parecia bem mais que impossível.
- Certo, vamos fazer diferente. – Ele disse pensativo e afastou um pouco as pernas. – Sente-se direito. – Ele disse depois que colocou o banco um pouco mais para trás, dando-nos mais espaço. Eu me sentei diretamente no estofado, agora conseguia alcançar os pedais, mas a respiração dele, agora mais perto da minha nuca, não me ajudava em nada. – Consegue agora?
- Sim.
- Ótimo, agora tente se concentrar.
Difícil.
Aos poucos, estava conseguindo me acostumar com ele ali, tão perto. Mas foi então que eu percebi que o que me instigava de maneira tão avassaladora não era a grande quantidade de contato tão íntimo. Era a maneira como ele me explicava pacientemente o que eu deveria fazer. Como segurava a minha mão com calma enquanto me mostrava a maneira correta de passar uma marcha ou segurar no volante. O jeito como não se atreveu a tirar vantagem disso para forçar alguma coisa. Isso era o que mais significava para mim, o respeito e o carinho com que me tratava, pela primeira vez, lembrou seu outro ego.
Embora a percepção disso tenha me fascinado e me feito perder o foco temporariamente do que eu estava aprendendo, ao mesmo tempo, me atemorizou. Foi aquele mesmo sentimento da perda do controle. Foi quando eu notei que o que eu sentia me dominava, tomou conta de mim e eu nem sequer havia notado. Não havia percebido até aquele momento que eu adquirira um vício. Eu caíra nas armadilhas e teias do amor. E não poderia fugir.
Foi relembrando esse momento e o da noite passada, quando estávamos jogando palavras-cruzadas no tabuleiro, que eu consegui ter um sono pleno e calmo. Levantei-me com um susto e pulei para fora da cama, estava atrasadíssima... De novo.
Vesti-me de qualquer modo, joguei uma água no rosto e escovei os dentes em velocidade recorde. Não que eu já não fosse acostumada a chegar atrasada em, praticamente, todos os dias de aula, mas daquela vez seria diferente. Eu teria prova final do bimestre no primeiro horário e, chegar atrasada, faria minha nota despencar, o que era incomum.
- Achei que não iria acordar mais. – Eu cheguei na sala e Sofia informou tranquilamente enquanto passava requeijão em uma torrada industrializada.
- Por que você não me acordou? – Deixei a ira transparecer na voz. Eu estava, realmente, chateada por ter uma irmã que não pensa que chegar atrasada poderia me causar problemas.
- Porque você não pediu. – Ela deu de ombros e continuou lambuzando a torrada. – Além do mais, ainda estou protestando contra a sua desorganização. Não vou entrar lá enquanto não arrumar tudo. – Deu uma mordida no alimento.
- Você não está apressada? Você odeia se atrasar. – Eu resmunguei enquanto ficava de um pé só para colocar o tênis.
- Verdade. – Ela disse ainda calmamente, estava fazendo de propósito. – Mas eu não tenho nada muito importante hoje.
Meu olhar furioso perfurou sua nuca.
- Não adianta me olhar assim. – Ela disse ainda sem se virar. Estava sentada à mesa de costas para mim e parecia não se importar muito. – O erro foi seu.
- Eu tenho prova no primeiro turno, Sofia! – Disse em voz alta esperando que ela, pelo menos, olhasse para mim enquanto estivesse falando comigo. Ela atritou uma mão na outra para retirar os farelos e levantou-se.
- Eu já estou pronta. – Disse com delicadeza e esperou perto da porta.
Acho que ela estava tentando a tática que mamãe costumava usar quando fazíamos algo que a aborrecia. Certamente, os atrasos incomodavam Sofie e ela, inteligente como sempre, havia percebido de que se esgoelar contra mim não estava adiantando, já que não poderia ir à escola sozinha. Então deveria estar tentando outra estratégia que é a de fingir indiferença na esperança de que eu mesma perceba meu erro. Estava funcionando. Era, simplesmente, irritante estar atrasada e preocupada ao lado de alguém que parece não se importar.
- Acha que vamos chegar em tempo? – Eu perguntei mais calma enquanto trancava a porta.
- Depende... Você é um jamaicano com um número nas costas? – Ela perguntou com desdém enquanto, de novo, descíamos as escadas por estarmos atrasadas demais para esperar o elevador.
Ás vezes o destino é tão irônico que prega a mesma peça duas vezes e, nessas horas, as pessoas que diziam que um raio nunca cai duas vezes no mesmo lugar notam que estão enganadas.
Novamente, a pressa me fez dar de cara com um vizinho. E, como nada acontece por coincidência, não poderia ser outra pessoa diferente.
- Você nunca aprende, não é? – Sam perguntou com divertimento enquanto segurava meu pulso para evitar uma possível queda. Eu que havia me desequilibrado, claro, ele pareceu nem sentir o impacto.
- Parece que não. – Sorri. – Desculpa, depois conversamos, estamos sem tempo! – Eu disse rapidamente e voltei ao meu trajeto.
- Eu levo vocês, acabei de chegar e não tenho outra ocupação nesta manhã.
Sofia parou de andar na mesma hora e disse:
- Ótimo.
Eu congelei como estátua no momento em que ouvi as palavras. Teria sido um ótimo evento visto que ir com ele certamente nos pouparia tempo e permitiria que eu fizesse a prova, mas eu pensei nas possibilidades. Sofia não fazia idéia do problema do Sam e, ironicamente, nem ele mesmo sabia, o que tornava tudo uma situação muito delicada.
Sofie nunca tivera contato com essa personalidade do Sam, salvo por aquela primeira vez que nos trombamos nas escadas em contextos muito semelhantes. Era natural que ela comentasse alguma coisa com ele, por exemplo, perguntar que fim levou nossas aulas de direção antes de ontem. Ele, por sua vez, não entenderia nada e, aí sim, teria certeza de que eu sei algo que não quero lhe contar.
- Não precisa. – Eu tentei me expressar sem parecer que uma onda fria de pavor corria pelo meu corpo.
- Você não tem que chegar cedo para fazer uma prova?
- Podemos chegar a tempo se formos à pé, Sofie. Vamos.
Sam olhou no relógio de pulso.
- Não conseguirão. Vamos, eu as levo. – Mudou imediatamente o curso de subida e passou a descer conosco até o estacionamento antes que eu pudesse dizer uma palavra.
Era uma situação muito delicada, já que eu deveria escolher entre chegar atrasada e perder uma prova ou arruinar tudo se minha irmã resolvesse abrir a boca, o que era bastante provável que faria. Ao mesmo tempo, se eu negasse insistentemente a carona, ele poderia desconfiar ainda mais dos motivos que me levariam a preferir andar quarteirões e chegar atrasada a passar alguns minutos com ele.
Chegamos ao estacionamento e fomos em direção a uma gigante moto preta que estava depositada em uma das vagas. Lembrei-me da vez em que andei nela, parecia tanto tempo atrás. Eu achei muito estranho, mas logo ele se desviou e abriu um carro prateado que estava parado a poucos metros de distância do veículo de duas rodas mais bonito que eu já vira.
- Aquela moto é bem legal, não acha?
- Muito.
- Eu teria uma se fizesse o estilo radical. – Ele falou antes de abrir a porta para mim e esperar que eu entrasse. Coloquei a mão direita sobre a testa e fechei os olhos, que má escolha aceitar esse convite.
Ele também abriu a porta para Sofia, que agradeceu com muita educação e logo deu a partida. Notei que era também um carro muito bonito, mas não era o veículo preto em que estivemos apertados em um estacionamento na noite anterior ao sorvete. Sam nem deveria saber que tinha dois carros e uma moto.
Deu a partida e dirigiu tranqüilo pelo trânsito que, geralmente, levava Sarah á loucura. E eu tinha a certeza de que eram poucas as pessoas que conseguiam manter a calma quando estavam dirigindo. O fato é que, mesmo na velocidade baixa em que ele dirigia, iríamos conseguir chegar à tempo ao colégio. Isso era o que importava, eu acho.
- Gosta dessa música?
- É bem legal. – Eu respondi. Decidi que o mais sensato seria conversar bastante para evitar que Sofia falasse muito. – Apesar de que eu prefiro o álbum anterior deles. Quero dizer, a banda tinha um estilo bem mais original nos outros discos e agora parece que está tentando aprimorar o som, mas está caindo naquele ponto clichê das bandas desse tipo.
- Concordo. É bem comum que algumas bandas desistam do som próprio proposto no princípio para tentar se adequar à moda. Uma pena. – Respondeu amigavelmente enquanto prestava atenção no tráfego.
- Também acho.
- E você Sofia? O que acha? – Ele perguntou sorridente olhando pelo retrovisor para encarar a minha irmã que parecia bem compenetrada nos próprios pensamentos e não estava falando muito, ainda bem.
- Não gosto de música.
- Ele estuda música. – Eu falei irritada com a falta de senso da minha irmã, mas depois me arrependi.
Ela, ao contrário do esperado, não ficou envergonhada pelo comentário, só nos encarou e disse:
- Que péssimo para ele então.
- Sofia...
- O quê? As pessoas se dedicam às artes como uma maneira de se expressar ou até de promover algum tipo de relaxamento ou terapia. Eu não preciso disso, eu tenho a física. Nem todo mundo canta no chuveiro, Mellanie. – Me lançou aquele olhar de censura que me fez corar.
- O que você canta? – Sam pareceu achar divertida essa revelação tão embaraçosa sobre a minha pessoa. Eu mal sabia cantar, era só por instinto ou sei lá.
- Nada. Ela está inventando.
- O quê? Eu não minto! – Ela protestou. – Qualquer pessoa em um raio de um quilômetro sabe que estou falando a verdade. Ele é nosso vizinho, deve te ouvir.
- Na verdade não. – Ele respondeu ainda sorrindo, mas franziu as sobrancelhas.
Eu costumava tomar banho à noite, depois que chegava dos estudos com a Rebecca e antes da novela. Justamente o horário em que ele pensava que estava dormindo. Resolvi não responder para não prolongar o assunto onde estávamos chegando a um ponto perigoso. Ficamos em silêncio por algum tempo.
- Você ainda tem alergia a cães, Sofia? – Ele perguntou tentando, obviamente, recuperar o bom clima dentro do carro. Esse assunto era, de maneira definitiva, mais perigoso que o anterior, visto que ela enchia os ouvidos de qualquer um quando o assunto era a alergia.
- Ainda. É por isso que eu sempre peço para você passar anti-séptico nas mãos quando aparece lá em casa. – Ela respondeu um pouco impaciente por ele, aparentemente, não entender a genialidade dela ao pensar em um modo saudável com que ele pudesse nos visitar sem transmitir agentes que a deixariam inchada por horas.
Eu tremi. Meu corpo inteiro tremeu, por dentro e por fora. O suor frio tomou conta das minhas mãos. Fechei os olhos esperando algum milagre, mas eu saberia que ninguém deixaria de fazer perguntas quando lhe dizem que esteve em algum lugar em que não se lembra.
- Quando foi a última vez que estive lá? – Ele perguntou assustado, aproveitando o semáforo na luz vermelha para analisar o rosto despreocupado da Sofia.
- Ontem.
Fim da parte 1
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41 comentários:
cara vc manda muito bem..adoro sua historia...ele prende a gente de uma tal maneira...eii não q manda um sam por sedex naõoo
NOSSA!!! E AGORA?? Tô super curiosa!!!
Adoreeeei cara. Fico boquiaberta com sua história. E sempre para na melhor parte, não é juuuusto >< UHAUSDUHASUHDAUHSD
Não demora tanto tempo pra postar não, o coração fica pra sair pela bocaa :P
Carambaaaa, muiitooooo bommm, kkkkkk!! Adoro a Sofia, ela me diverte bastante.
Estou adorando o rumo que essa história está tendo. Estou muito curiosa com a reação que Sam e Mel vão ter.
Que maravilhosaaaaaaaa!!!!
Essa história ta ficando cada vez melhor!!! To amando!
Continue postando sempre e parabens pela criatividade!!!
Bjs
♥
ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh , :x , eu matava a sofie cara :x UAHHAUHAHAHAHA
posta logo :~
Muito bom!!
Adorei,COMO SEMPRE!
=D
OMG ! num para aí *subindo nas paredes de curiosidade* aaah eu matavaaa a sofie [2]
Droga. Por que você tem que fazer todo esse suspense? Eu fico morrendo de curiosidade e você demora um monte pra postar de novo. u.u
Posso te dar uma opinião?
Olha, eu acho que você deveria marcar os capitulos por assunto. E acaba-los quando acaba o assunto. Eu sempre tenho que reler um pouco do capitulo anterior pra lembrar onde parou sabe? Ai se você colocasse tudo o que for relativo em um unico post, ficaria melhor. Por exemplo: a ultima postagem -anterior a essa - deveria ter terminado nessa parte: "- Se eu me importasse, não estaria dizendo até amanhã. – Aproximei-me e beijei-lhe os lábios quentes. Era isso o que me dava forças para continuar.- Até amanhã. Ele sorriu." Por que assim, já começaria esse com um outro assunto, quase independente. Agora quando você acaba a postagem no meio, fica confuso.
Bom, é uma sugestão. Não estou querendo me meter nem nada, só ajudar, afinal, sou uma super fã da sua história e quero o melhor pra ela e pra você.
E como disse a Myh Cabral, não tem como mandar um Sam por sedex???
♥
me deu vontade de tomar sorvete de cereja e limão rs
aeeeeeeeee q agora?
weeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeee!!!! esperano o proshimo capitulooooo!!!!!
xoxo
Jojo
Porque faz tanto suspense? ):
Eu me prendi a essa história, na verdade eu me apaixonei por essa história, a gente chega todo dia querendo um novo capitulo, e quando tu posta, tu fica tão mega feliz que nem quer fazer outras coisas, só ler e se entreter com a história. Amo isso e tomora que tu publique, concerteza eu compro *-*
Quando sai o próximo post ?
awnnn, não querendo ser intrometida nem nada, eu nem sei dos seus motivos e tal. mas se você demora tanto pra postar por falta de tempo, porque você nao pede ajuda pra outra pessoa postar pra você?
você mata a gente com esse suspense tooooooooodo *o*
Eu quero Inverso em livro!!!!!! :(
AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAMEI!
=OOO
morri. *u*
sofia má!
olha, eu não concordo muito bem com a opinião da andressa não. =/
o que é mais emocionante na historia é isso: o suspense. e mágica. a curiosidade. etc.
adoro esse gostinho de quero mais que o seu suspense nos da Meel.
Parabééns.!
♥³³³³³³³³³³³³3
OMGGGG Esta muito tenso esse final!! To norvosa! ahushauhsa
Mas eu concordo com a natiiikaa, o suspense deixa mais emocionante! ahusihaiuha Take your time!
Estou com as pessoas que comprarao seu livro assim q ele for lancado, e vou querer autografo tambeeem! ;P
Você escreve muitíssimo bem! Estou impressionada! Parabéns!
Tenho apenas uma ressalva: Você já reparou que a sua história é quase uma cópia de "Crepúsculo"?
Mas ainda assim, parabéns!
Mal posso esperar pelo próximo capítulo!
cópia de crepúsculo? não viaja ¬¬'
tem alguns minimos detalhes parecidos, mas são completamente diferentes. crepúsculo trata sobre vampiros e seres misticos em geral. inverso é sobre dupla personalidade. a maior semelhança é que tem romance no meio disso, mas linda,livro de romance não existe SÓ crepúsculo (apesar de na minha opniao ser o melhor *-*)
Wow ...estou A-M-A-N-D-O sua história! Eu sou nova aqui e você realmente conseguiu me prender! POR FAVOR nunca pare de postar , é muito perfeito para você não compartilhar ! Não vejo a hora de ler o próximo poste !
Beijos e Parabéns!
Natika, que bom que você não concorda. Pra uma pessoa que escreve, a melhor coisa é isso: que os leitores expressem suas opiniões e ajudem o escritor a melhorar cada vez mais. Digo isso pq também escrevo.
Mas eu continuo com meu ponto de vista, que ela deveria dividir melhor os capitulos.
E poxa, já é sexta já. É o fim da semana. Posta por favor.
Tambéém concooordo Andressa. eu escrevo tbm, e adooro as pessoas que dão opnio~es, só me ajudam a melhorar meus textoos! tambem já to morrendo de ansiedade! ='O
cópia de crepúsculo? não viaja ¬¬'²
que meniina loooucaa.
PELAMORDEDEUS! ME DIZ O QUE O "INVERSO" TEM A VER COM CREPÚSCULO????????/
MORRI.
que garota looouca!
Se você parar pra pensar, tem sim algumas coisas em comum com Crepusculo, veja: Em ambos, existem pessoas "diferentes" - em crepusculo Edward, o vampiro e em Inverso, Sam, o cara de dupa personalidade; Nos dois, a vida da protagonista era monótona e sem graça e mudou quando conheceu o protagonista - que vira sua vida de cabeça pra baixo; Ainda nas duas histórias, temos uma linda história de amor, o amor com que sonhamos por toda a vida - que nos tira o ar e nos faz esquecer de tudo desde que estejamos ao lado do amado; E o mais importante de tudo: os dois são muito bem escritos, de uma maneira que nos fazem respirar cada suspiro dos protagonistas, chorar cada lágrima, rir cada riso e AMAR cada linha escrita. Quem já leu Amor de Perdição e Romeu e Julieta, vai entender. Obras completamente diferentes que se relacionam e tem um desfecho parecido. Em ambos, ocorre a morte por causa do amor. Hmm, viajei, não tem nada a ver Amor de perdição e Romeu e Julieta com Crepusculo e Inverso. Mas acho que foi isso que ela quis dizer. Em CONTEXTOS completamente diferentes, uma HISTÓRIA que lembra a outra. Quer saber o por que disso? Pergunte a autora se ela leu crepusculo, se ela gosta do livro. Isso chama-se inspirações. Todo artista tem suas inspirações nos artistas que eles admiram. Quanto mais ela escrever, mais ela vai criar a sua própria identidade.
Ah e esqueci de mencionar: JÁ É SÁBADO! 00:10!!!! QUERO POST!!!!!!!!!!!!!!!
Por que continua aparecendo o "Andressa disse..."???
Deixei 3 coments seguidos e achei que vcs iam achar que eu era louca, ai resolvi apagar um. Mas continua ali! asehusaea
Bom, como esse é o quarto, vocês vão achar que sou mesmo louca. Eu não era não. É essa espera que está me deixando louca. por favor, por favor, por favorzinho (olhinhos do gato do shrek ) por favooooorrr postaaaaa!!!!!!!!!
NÃO TEM NADA A VER INVERSO COM CREPÚSCULO!! TIRANDO O ROMANCE, TEM NADA!!!
Repito: Em ambos, existem pessoas "diferentes" - em crepusculo Edward, o vampiro e em Inverso, Sam, o cara de dupa personalidade; Nos dois, a vida da protagonista era monótona e sem graça e mudou quando conheceu o protagonista - que vira sua vida de cabeça pra baixo; Ainda nas duas histórias, temos uma linda história de amor, o amor com que sonhamos por toda a vida - que nos tira o ar e nos faz esquecer de tudo desde que estejamos ao lado do amado; E o mais importante de tudo: os dois são muito bem escritos, de uma maneira que nos fazem respirar cada suspiro dos protagonistas, chorar cada lágrima, rir cada riso e AMAR cada linha escrita.
eu concordo com isso que a andressa disse dos capítulos. eu também sempre tenho que reler o final do último post. deixar curiosidade é bom , mas prefiro que termine um assunto , e tal no msm post . enfim . e pode ter coisas parecidas com crepúsculo , por conta do amor e tal , mas não venha me dizer que é praticamente uma cópia --' , são histórias diferentes , só que as duas envolvem amores complicados
e não só essas duas que envolvem amores complicados! caramba, exitem tantos livros e filmes que tem isso. mas pra falar que é cópia de crepúsculo então crepúsculo foi o único que você leu g.g
aaaah concerteza!todos os livros de amor se baseam em historias desse tipo! nesse caso a historia dos dois se bateu por o Sam ser um cara de duas personalidades, um ''problema'' e o Edward um vampiro, um ''problema, aos olhos dos personagens. Maais pra mim nenhum é problema e os dois são bons *----*
ambos tem uma semelhança mais são historias diferentes ;]
Muito bom...
Tambem quero um SAM na minha vida
--------x---------
Nossa mel parabéns mesmo, a cada dia essa historia me deixa mais curiosa para saber se haverá mais e mais '=D
quero um SAM PRA MIIIIIIM!
lindo lindo lindo!!
LINDO!!
E agoraaaA??
Acho que ele vai descobrir!!
flei que ele ia descobrir!!!
XDDDDD
Mentiraaaa nem descobriu '-'
maissssss
:O
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